O questionamento tornou-se
frequente depois de uma aula em que debatia o tema relacionamento e, especificamente, o que homens e mulheres
esperavam de um(a) companheiro(a) ao relacionar-se. Numa turma de maioria adolescente e feminina, logo veio um discurso recorrente entre as meninas:
"sucesso profissional e estabilidade financeira".
Estranhei, indaguei, mas era isso
mesmo... As jovens, realmente, estavam afirmando que era muito importante que o
companheiro pudesse lhes proporcionar conforto financeiro e, mais, que assim pensavam a maioria de suas colegas!
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Cleópatra representa o poder da mulher |
Os dias se passaram e, por um
tempo, quase me esqueci do episódio. Até que um dia estava eu conversando com
um colega e duas colegas de trabalho sobre os papeis que o homem e a mulher desempenhavam num
relacionamento. E estava eu ali, de novo, estranhando o fato de eu e meu colega
estarmos defendendo a emancipação, a igualdade de direitos e a valorização da
mulher enquanto nossas colegas diziam querer tudo isso, mas "sem sobrepor a voz
de comando e a última palavra que o homem precisava ter no casamento". Segundo
elas, nós homens precisávamos ainda ganhar mais para dar-lhes segurança e
conforto.
Voz de comando?! Última palavra?!
Ganhar mais?! Ainda existiam mulheres pensando assim? Para uma das colegas e minhas alunas, a
maioria! Por quê?! Para quê?! Uns alegam que é uma condição biológica. "A mulher é mais
frágil; precisa da proteção masculina. A mulher, institivamente, busca um
companheiro capaz de lhe prover as melhores condições de vida para si e para os
filhos que almeja reproduzir". Isso não me convence!
Penso que esse comportamento é
muito mais social, cultural, ideológico e histórico do que biológico. Se fosse
preponderantemente biológica essa condição não haveria espaço para sociedades
matriarcais relevantes como os Nagovisi, na
Austrália, ou o povo de Meghalaya, no nordeste indiano, que
talvez seja o único local do planeta que possui um movimento de emancipação
masculina: o Synkhong Rympei Thymmai.
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Miss Fisiculturismo 2009. Frágil, né?! |
O sexo é biológico, mas o gênero não. Assim, as mulheres não nascem mulheres (fragilizadas ou submissas), elas se tornam mulheres (fragilizadas ou submissas). O problema é que essa “liderança”
e essa “superioridade” do homem foi tão reproduzida ao longo da história que
internalizamos como um traço quase genotípico.
Em outra ocasião, perguntei a uma outra colega
se ela concordava com essa diferença salarial e sobrepujança do homem sobre as
mulheres. Ela titubeou... mas, sim, concordava. Queria que seu marido ganhasse
mais que ela. "Por quê?" Perguntei-lhe. "Não sei", disse ela. Você não tem anseio de
ganhar bem? Construir sua carreira profissional ou acadêmica e seus ganhos financeiros independente de
outra pessoa? Será que é por que você acha mais fácil para o homem ganhar mais?
"Será?!", refletiu ela.
Mas por que essas posturas
estavam me incomodando? Por que elas me incomodam e sempre incomodaram? O que está por trás desse imaginário? Quais as
consequências dessas concepções e atitudes?
Que lugar essas mulheres querem (são conduzidas a querer) para si na
sociedade? O lugar da submissão? Da voz e do papel secundários? Dos salários
menores que os dos homens? Não querem uma carreira promissora? Quais são suas ambições
pessoais?
Minha preocupação é que da voz de
comando ao autoritarismo, à violência simbólica (psicológica e social) e à física há um limiar tão ínfimo.
Isso tudo e o machismo são o mesmo assunto. Para que voz de comando se num
relacionamento os dois podem decidir em conjunto, em pé de igualdade? Por que o
homem precisa ganhar mais se ambos podem ganhar a mesma coisa... se o homem
pode ganhar menos... se o homem pode nem trabalhar se ambos concordarem... se a mulher pode ganhar menos ou nem trabalhar, SE ASSIM QUISER? Vamos
basear nossos relacionamentos interpessoais na economia... no capital (como se não bastassem
as relações socioeconômicas...)?
O que ocorre é que, tendo voz de comando,
ganhando mais, pagando as contas da casa, comprando presentes ou pagando cursos
da esposa, alguns homens (não encontrei um nome mais apropriado...) pensam que
são proprietários de suas mulheres (coisas?!) e que elas lhe devem obediência e
submissão por isso.
Um fato a ser considerado: mulheres
são mães. E não por genética, mas por educação, reforçam, às vezes, essa voz de comando
dos homens ao reproduzir esse modelo na criação de seus filhos, priorizando-os em detrimento de filhas, concedendo-lhes privilégios, denegrindo a imagem das mulheres com que eles se relacionam, acobertando traições e atitudes de violência. Por isso e pela
estupidez de muitos homens, a cada cinco minutos, uma mulher é vítima de
violência no Brasil... Segundo relatório de uma pesquisa do sociólogo Júlio Jacobo, enviado ao Ministério da Justiça
em 2012, em cerca de 70% dos casos, quem espanca ou mata a mulher é o namorado,
marido ou ex-marido. Enfim, enquanto os homens morrem na rua, as mulheres morrem em
casa.
Não quero, com tudo isso, inflamar
o feminismo ou a qualquer luta pela supremacia da mulher. Como diria minha irmã,
é apenas a reivindicação por igualdade de respeito e de condições de vida digna
independente do sexo ou do gênero! Somando-se ao combate contra o pensamento
chauvinista masculino (ainda) hegemônico, no fim de semana subsequente àquela conversa no
trabalho que tive, vi uma reportagem no Fantástico, da TV Globo, que, mais do que dados
alarmantes sobre violência contra mulher no Brasil, traz um exemplo de mulher que não se submete a qualquer diminuição baseada no gênero, a delegada Susane Ferreira:
Se não concordam comigo ou com a
delegada do vídeo, se não querem igualdade de condições humanas e
socioeconômicas, afinal, o que querem, vocês mulheres?!!! Ajudem-nos a
entender...